Solução de Consulta Interna
Cosit
nº 14, de 17 de dezembro de 2021
(Publicado(a) no Boletim de Serviço da RFB de 03/01/2022, seção 1, página 3)
Origem COORDENAÇÃO-GERAL DE ADMINISTRAÇÃO ADUANEIRA
Assunto: Reclassificação de objetos em razão de atualização da Tabela de IPI
O tratamento dado pela Lei a determinados produtos deve ser mantido, mesmo que estes passem a ser classificados sob novos códigos da Tipi em razão de atualização do Sistema Harmonizado.
Dispositivos Legais: Decreto-Lei nº 4657 de 4 de setembro de 1942 arts. 2º, § 1º e 5º; Lei nº 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional), arts.108 e 111; Decreto nº 7.212, de 15 de junho de 2010 (Regulamento do IPI), art. 2º; Decreto nº 7.660 de 23 de dezembro de 2011 (Tipi/2012); Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015 arts. 14, 24 e 34; Decreto nº 8.950 de 29 de dezembro de 2016 (Tipi/2017).
A Coordenação-Geral de Administração Aduaneira (Coana) formulou consulta interna a esta Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) acerca do tratamento tributário a ser dado a produtos cuja classificação fiscal na Tabela de incidência do IPI (Tipi) se dava sob o código Tipi/2012 2202.90.00 e que foram posteriormente distribuídos sob os códigos Tipi/2017 2202.91.00 e 2202.99.00, tendo em conta que o 2202.90.00 fora extinto na nova versão da tabela.
2. Ao descrever a questão, a consulente aponta a existência de uma tabela de correlação entre códigos publicada no sítio da Internet do extinto Ministério da Indústria Comércio Exterior e Serviços (MDIC)¹.
3. Adita que, conforme tal tabela, a antiga classificação 2202.90.00 corresponde às novas NCMs 2202.91.00 e 2202.99.00 do SH 2017. Todavia, faz as seguintes observações:
Embora as descrições da TIPI 2012 e 2017 permitam estabelecer uma relação de “um para um” entre as classificações antigas e as novas, a página do MDIC ressalta que as correlações apresentadas destinam-se apenas à orientação dos usuários, não tendo caráter oficial, ou seja, depreende-se que esta correlação não possui qualquer caráter normativo. Apesar disso, a SAREX adotou uma postura conservadora e manteve a majoração para essas novas classificações, em função da correlação informada pelo MDIC.
Assim sendo, gostaríamos de um parecer da COSIT sobre o cabimento ou não da majoração ou redução de alíquota para uma nova NCM correlacionada com outra para a qual a legislação já previa majoração ou redução.
5. Há de se mencionar que a lei tributária exige interpretação literal na maioria dos casos, na medida em que, em regra, representa permissão ao ente político para que invada a propriedade dos contribuintes. Assim, a tipicidade tributária é cerrada e deve ser disposta em lei estrita, anterior e de clareza cintilante.
6. Entretanto, deve-se evidenciar que é comum que a lei referencie outras normas com vistas a delimitar o objeto sobre o qual devem recair seus comandos. É esse o caso em questão: a lei utiliza uma referência (código Tipi) para atingir objetos sob ela albergados. Sabe-se que não há norma que diz expressamente que o(s) novo(s) código(s)-referência(s) sub-roga(m) todas as vinculações do antigo, embora seja esse o efeito prático óbvio.
7. Tal obviedade decorre da ideia de continuidade normativa que assenta a lógica comum de vinculação substantiva em toda a esfera jurídica, quando há sucessão de normas. E aqui pode-se resgatar que essa ideia é utilizada até no Supremo Tribunal Federal, na análise de perda do objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade. O Tribunal admite, por exemplo, a requalificação do objeto caso a lei originalmente impugnada seja revogada antes da apreciação pelo colegiado, mas os dispositivos sejam reproduzidos em lei nova², que seria a nova referência, portanto. Vê-se que a hermenêutica jurídica contemporânea prima pela busca da substância, pelo aspecto material da norma, e não por referenciais indexadores que podem eventualmente ser modificados.
8. Além disso, a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, no art. 2º, §1º, é clara ao estabelecer que a lei posterior toma o lugar da que a precedia ao revogá-la. Ainda esse diploma, no art. 5º, remete à interpretação teleológica, ou seja, à necessidade de o intérprete buscar a finalidade da norma. No caso em cena, a nova Tipi entrou em vigência e revogou a anterior, em adequação a padrões internacionais de classificação fiscal. Assim, extinguiu códigos, criou códigos novos e reclassificou determinados objetos. Não é razoável exigir-se a atualização de todas as normas que referenciem códigos NCM ou Tipi, ou imaginar que comandos normativos não seriam aplicáveis em razão de atualização desses elementos, pois a atualização constante é da essência da tabela.
9. Além disso, o olhar teleológico direcionado ao art. 14 da Lei nº 13.097, de 2015, aponta a evidente finalidade de atingir produtos determinados. Tanto o é que o parágrafo único do artigo, tratando das posições 22.01 e 22.02 da Tipi/2012, restringe o tratamento ali referido exclusivamente a “água e refrigerantes, chás, refrescos, cerveja sem álcool, repositores hidroeletrolíticos, bebidas energéticas e compostos líquidos prontos para o consumo que contenham como ingrediente principal inositol, glucoronolactona, taurina ou cafeína”. Isso deixa claro que as alíquotas declinadas no art. 24 da mesma lei se aplicam a tais produtos, no modo como ali disposto. Ademais, a título de informação, vale dizer que a majoração das contribuições busca resgatar arrecadação perdida em razão da grande redução das alíquotas do IPI incidente sobre tais produtos.
10. Por fim, há de se ressaltar que não é caso de aplicação de analogia, uma vez que esta é um método de integração da lei, ou seja, técnica de colmatação de que se deve lançar mão ante a ausência de previsão específica em lei, em que se aplica uma disposição legal que regula casos idênticos/semelhantes ao que não está previsto. Ou seja, amplia-se o universo de objetos atingidos pela norma pela proximidade essencial que guardam com aquele sobre o qual a norma é específica. Observe-se, contudo, que no caso em tela não há qualquer lacuna, uma vez que a norma permanece atingindo o mesmo objeto, embora este esteja referenciado em outra classificação fiscal.
11. Do exposto, conclui-se que o tratamento dado pela Lei a determinados produtos deve ser mantido, mesmo que passem a ser classificados sob novos códigos da Tipi em razão de atualização do Sistema Harmonizado.
12. O código fiscal é mero indexador que enquadra a descrição substantiva de determinados produtos. O objetivo da lei é atingir o universo de produtos nele albergados, não o código em si. Portanto, caso esses produtos venham, posteriormente, a ser classificados sob novo(s) referencial(is), continuarão sendo atingidos pelo tratamento legado em lei anterior.
Aprovo. Providenciem-se divulgação interna e posterior publicação na forma da Ordem de Serviço Cosit nº 1, de 8 de abril de 2015.
*Este texto não substitui o publicado oficialmente.